quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Os sons da Alma e a sociedade ouvinte - Final



Os sons da Alma e a sociedade ouvinte (Final)

Paiva Netto

Prossigo com trechos da entrevista concedida pelos atores Sueli Ramalho e Rimar Segala, irmãos surdos de nascença, ao programa “Sociedade Solidária”, da Boa Vontade TV (canal 20 da SKY).

Cônscios do valor da arte no processo de incluir socialmente os que não possuem a audição, em especial crianças, Sueli e Rimar montaram a peça “A Orelha”. Comenta Sueli: “Começamos a dar aulas de Libras [Língua Brasileira de Sinais] aos pais das crianças e, ao mesmo tempo, a ensiná-los a apresentar uma peça de teatro para os filhos. A peça mostra, através do humor, a realidade da cultura surda e como você pode abordar um surdo. A língua de sinais me ajudou a falar. Não proíbam o uso das mãos. É o nosso recurso, nossa visão”.

LIBRAS
Em 24 de abril de 2002, tivemos a promulgação da Lei 10.436, que oficializou a Língua Brasileira de Sinais (Libras). Entretanto, equivocam-se os que a consideram uma tradução [por gestos] da língua portuguesa. Ela tem estrutura e gramática próprias. Rimar Segala explica: “O português é uma língua oral, a Libras é visual [gestos, expressão corporal e facial] (...)”.
O que poucos sabem é que os surdos também têm sotaques diversos: “Citemos, como exemplo, o gesto para significar ‘mamãe’. Existe uma série de sinais linguísticos para essa palavra”. E para demonstrar a riqueza da Libras, apresentou diferentes formas de dizer “boa tarde” nos Estados do país.

REALIDADE BRASILEIRA
Analisando a realidade de muitas famílias, Rimar assinala: “Todas as mulheres quando engravidam sonham ter um filho saudável, lindo. Quando nasce com problema de surdez, elas levam um susto pela diferença e, então, bate o desespero. Sem preparo, tratam a criança surda no modelo da ouvinte. Não percebem que esse diferencial é simplesmente outra cultura. Esse programa está sendo muito importante ao passar informações para todas as mães que estão nos assistindo. Se vocês tiverem um filho surdo, por favor, procurem aprender a língua de sinais, entender todas as culturas. Respeitar essa grande diferença é um extraordinário investimento para o futuro do surdo, para unir a família”.
Outro ponto de relevância é a inserção no mercado de trabalho. “Será que surdo pode trabalhar? Qual o cargo certo? Posso deixar o telefone na mesa? O desconhecimento é muito grande. A peça ‘Palhaços no RH’, que criamos, mostra qual é o parâmetro que podemos utilizar numa empresa que tem uma pessoa com deficiência auditiva”, acrescenta Rimar.
Breve abordarei aqui a dificuldade do acesso das crianças com deficiências às escolas comuns.
Continuando, os dois irmãos atores trazem, ainda, dicas de bom convívio: “O surdo é visual. Não adianta nem gritar, caso não esteja na visão dele. Se houver um interruptor por perto, acender e apagar as luzes faz parte da cultura surda”, explica Sueli. “Ou então chegue perto do surdo e chame-o. Também é importante que todos os funcionários possam conhecer pelo menos o básico da Libras. ‘Oi, tudo bem?’ é um cumprimento que nos faz sentir inseridos na sociedade”, completa Rimar.
Por fim, o ator Rimar Segala revelou coincidência envolvendo a estampa de Jesus, o Cristo Ecumênico, bastante difundida pela LBV. “Desde pequeno sempre via na televisão um símbolo muito importante, a imagem de Jesus Cristo. Hoje vi a mesma imagem aqui. Quero agradecer à LBV, porque é fundamental para todo o Brasil pensar em inclusão. Estou muito agradecido. Parabéns!”.
Grato a vocês por compartilhar tanta perseverança e coragem. Uma experiência de vida que inspirará muita gente. Para outras informações, acesse www.ciartesilencio.com.
O assunto vem despertando interesse entre os leitores, a exemplo de Haroldo Rocha (Porto/Portugal), Marcos Antônio Franchi e Mário Augusto Brandão (Glorinha e Gravataí/RS, respectivamente) e Regina Santos (São Paulo/SP). Minha saudação a todos.

José de Paiva Netto, jornalista, radialista e escritor.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Os sons da Alma e a sociedade ouvinte - Parte I



Os sons da Alma e a sociedade ouvinte (I)

Paiva Netto

É digna de respeito e louvor a biografia da célebre ativista social, escritora e conferencista norte-americana Helen Keller (1880-1968). Embora se saiba que, aos dezoito meses de vida, estava cega e surda, tornou-se, com o imprescindível apoio de sua amiga e professora Anne Sullivan Macy (1866-1936), um dos mais importantes ícones da luta pela qualidade de vida dos que têm deficiência. Um de seus pensamentos que mais admiro adverte: “Até que a grande massa de pessoas seja preenchida com o senso de responsabilidade para o bem-estar de todos, a justiça social jamais será alcançada”.

CORAGEM E PERSEVERANÇA
Apesar do encantamento que histórias como essa despertam, enganam-se os que acreditam que se trata de acontecimentos esporádicos da coragem e perseverança humanas. Na verdade, exemplos semelhantes ao de Helen estão por todo lugar, habitando, com frequência, o cotidiano. No que se refere à perda da audição, temos, atualmente no Brasil, quase 6 milhões de pessoas nesse estado.

Numa entrevista conduzida por Daniel Guimarães, no programa “Sociedade Solidária”, da Boa Vontade TV (canal 20 da SKY), os atores Sueli Ramalho e Rimar Segala, irmãos surdos de nascença, narraram belas experiências da trajetória de vida de ambos.

Ao ser indagada sobre de que modo encarava ausência de som na infância, Sueli comentou: “Sou filha de pais, avós paternos e bisavós surdos. Para mim, era normal. Minha língua materna sempre foi a de sinais. Eu achava que o mundo lá fora era deficiente. A gente morria de dó das crianças na rua, pois achava que mexiam a boca porque estavam com fome, porque não tinham chiclete ou bala na boca. Que mundo diferente é esse que não tinha chiclete? (risos) Queria ensinar todas essas pessoas a falar com as mãos. Era essa a minha preocupação”.

Por sua vez, Rimar Segala, por gestos traduzidos pela irmã, comentou: “A trajetória da Sueli foi diferente da minha. Embora sejamos surdos, a forma de comunicação é totalmente diferente. Sueli aprendeu [com ajuda de aparelho] a falar. Eu ainda não desenvolvi a fala. Quero muito falar com a sociedade ouvinte [termo que utilizamos para a pessoa que normalmente escuta]”. Sueli complementou: “Foi muito difícil aprender a língua portuguesa. Levei muitos anos para aprender a me comunicar com a sociedade ouvinte, porque o nosso recurso é totalmente visual. Ainda ‘apanho’ da língua portuguesa!”. (risos)

COMPANHIA ARTE E SILÊNCIO
Fundadores da Companhia Arte e Silêncio, eles perceberam, desde muito cedo, pela influência do pai, que a educação e a arte poderiam ser instrumentos valiosíssimos no auxílio ao deficiente auditivo. Rimar explicou: “Em minha casa tinha muita cultura. Meu pai ficava contando histórias da Bíblia, de Moisés, e quando fui para a escola especial de surdos, percebi a falta de sensibilidade com a parte didática, da história da educação do surdo. Consegui com a minha família tudo o que aprendi. Então me sobressaía nessa escola. Quando me graduei em Matemática, acabei criando uma história, uma adaptação através dela. Comecei a ser um criador de histórias. Isso acabou me direcionando para o teatro”. 
Ainda sobre o papel da educação, Sueli afirmou que “a maior dificuldade que as crianças surdas têm é da comunicação na própria família. É nela a primeira educação. Muitos pais querem aprender a se comunicar com seus filhos, mas não sabem como. Alguns deles ‘jogam’ as crianças na escola achando que o professor tem que fazer um milagre, como se a surdez fosse uma doença, por não possuírem a correta informação. Daí termos montado a peça ‘A Orelha’”.
Na próxima coluna, continuaremos esta incrível viagem a um universo silencioso, mas repleto dos mais expressivos sons na alma dos que escutam com os olhos do coração.

José de Paiva Netto, jornalista, radialista e escritor.




terça-feira, 19 de novembro de 2013

Ecumenismo étnico



Ecumenismo étnico
Paiva Netto

Vinte de novembro é o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. A data é comemorada durante todo o mês, com a participação ativa de movimentos civis, das instituições públicas e privadas. Em nosso país, a valorosa raça negra batalhou muito para ter seus direitos de cidadania garantidos e respeitados. A cruzada continua com novas conquistas a cada dia, graças a Deus.
Atualmente, setores diversos da sociedade reivindicam e trabalham por condições de vida decente para todas as etnias e classes sociais. A luta, a fraternidade e o amor fraterno nos transformaram em uma pátria multirracial, demonstrando ao mundo peculiar ecumenismo étnico, referência até mesmo para pesquisas acadêmicas.
 Estudiosos constatam que a miscigenação, aliás, como tenho defendido, é uma realidade em qualquer parte e que a tendência é termos o “ser humano médio”, cuja aparência já foi classificada como “brasileira”. É o que vimos em 2012, no estudo de Stephen Stearns, professor de Ecologia e Evolução Biológica da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, publicado no siteBusiness Insider. Também em 2007, o professor Henry Louis Gates Jr., diretor do Centro de Estudos Africanos, na Universidade de Harvard, disse à BBC Brasil que “o país tem a cara do futuro”.
A Humanidade, apesar de obstáculos aparentemente intransponíveis, possui destinação gloriosa. Ressalto na pregação ecumênica do Evangelho e do Apocalipse de Jesus que somos ainda habitantes novos no planeta. É fácil perceber isso na diferença de tempo que existe entre os poucos milênios de civilização conhecida e os cerca de 4,5 bilhões de anos da Terra. O potencial de que dispomos para vencer é imenso. E a cultura negra é parte inseparável desse sucesso.
Aproveito para transmitir uma saudação solidária ao amigo prof. dr. desbravador José Vicente, reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, em São Paulo/SP. Ele sempre foi um entusiasta e incentivador das nossas iniciativas em prol da valorização da raça negra. Certa vez, declarou que “isso tem inspirado muitos trabalhos, pois foi pioneiro. Talvez hoje seja mais fácil falar do negro, por uma série de conjunturas. Mas antes, quando era muito difícil ser a favor do negro, a LBV já o fazia”.

ESCRITOR PAULO PAIM
No dia 17, encerrou-se a 59ª Feira Internacional do Livro de Porto Alegre/RS. Os estúdios da Super Rede Boa Vontade de Comunicação, que cobriu o prestigiado evento literário, receberam a fraterna visita do senador e escritor Paulo Paim. É sempre uma alegria vir aqui na LBV. E faço com muita fé, com muito carinho, com muito respeito, até pelo trabalho que vocês fazem no aspecto social”, comentou o ilustre amigo.
No ensejo, gentilmente me autografou um exemplar do segundo volume de sua obra “Para além do que os olhos veem”, em que aprofunda, como ele mesmo relata, “o debate sobre os grandes temas que a população quer saber e quer resposta, desde a distribuição de renda, questões voltadas à saúde, à educação, à habitação, à mobilidade urbana”.
Ao senador e escritor, o nosso agradecimento.

José de Paiva Netto ― Jornalista, radialista e escritor.
paivanetto@lbv.org.br — www.boavontade.com 

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Solidariedade



Reflexão — Por Paiva Netto

Solidariedade para alavancar os objetivos

É fundamental aliar a fórmula Tecnologia, Ciência, Inovação e Cultura à Solidariedade Ecumênica, para que se promova, com maior urgência, essa transição para o pleno desenvolvimento sustentável. Integradas essas ferramentas de progresso pelo autêntico sentido de Amor Fraterno e de Justiça, que nos distinguem dos animais ferozes, poderemos fazer cessar os horrores que ainda persistem no mundo, quais sejam — como se encontram relacionados nos oito Objetivos do Milênio — a fome; a miséria; a falta de acesso à educação de qualidade; o desrespeito à igualdade de gênero e às mulheres e meninas; a mortalidade infantil; as condições desumanas de gestantes; a aids, a malária, entre outras doenças gravíssimas que dizimam populações inteiras; a espoliação do meio ambiente etc. Além de superar todas essas mazelas — dure o tempo que durar a luta —, é nosso dever construirmos juntos um modelo novo de desenvolvimento que efetivamente preserve a vida neste orbe.

 José de Paiva Netto — Jornalista, radialista e escritor.

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Reflexão extraída da revista BOA VONTADE Desenvolvimento sustentável, em que a Legião da Boa Vontade (LBV) apresenta recomendações aos participantes da Reunião de Alto Nível do Conselho Econômico e Social (Ecosoc) em 2013, no Palais des Nations, Escritório da Organização das Nações Unidas em Genebra, Suíça. Disponível em inglês, francês, espanhol e português.